terça-feira, 18 de maio de 2010

Disse-me Clarissa, em meio às lágrimas de quem se casa sem vontade: "Não sei o que me atraía mais. Conflitavam pelo primeiro lugar a sua inteligência extraordinária e a sua força de homem. Sim, porque era seguro de tudo, decidia bem, e quando não o fazia, encarava as conseqüências de frente. Junto dele, eu não tinha medo de nada. Se me propusesse irmos embora a não-sei-que-lugar, eu iria, porque tinha a certeza de que ele resolveria tudo. Era gentil, mas firme. Escutava as minhas opiniões, mas, no impasse, sabia fazer prevalecer a sua, "porque eu sou o chefe, meu bem", ele me disse tantas vezes, ao que eu fiquei emburrada e pisoteei, mas aceitei, porque o amei mais que a tudo. Sua autoridade de marido, que realmente se preocupava comigo, me atraía cada vez mais. Sua voz estrondosa, como de um trovejar, e o jeito como segurava a minha mão faziam surgir qualquer coisa de loucura em mim. Para ele, eu era um bibelô - o mais amado, mais querido, mais cuidado e mais brilhante dos bibelôs. Isso me permitia ser forte e confiar na fortaleza dele, ao mesmo tempo. Todas essas promessas de segurança que haviam sido feitas entre os nossos olhares foram quebradas por ele, e eu nunca saberia, não fosse um acaso qualquer. Eu não quis mais ser sua. Talvez até hoje ele não saiba o porquê e por isso me destrate, vez por outra. Mas não sabe que me teria feito o bibelô mais feliz do mundo. E hoje, vejá só, amiga-minha, entrego-me estática a esse destino materializado por outros. Não me movo, não grito, não esperneio mais. Eu, que sempre pensei que faria o meu."
E na hora do sim, houve o silêncio mais mudo que eu já ouvi. O mundo, como diria Lispector, respirava. Só ele e o noivo de Clarissa, contemplando a morte inevitável de quem não ama.