terça-feira, 25 de setembro de 2012

Se Deus tivesse facebook, você falaria com Ele?

"Mas livrai-nos do mal, amém."
(Da oração que Cristo ensinou)

Há dois meses, por motivos muito pessoais, resolvi dar um tempo do facebook. Os motivos, não discuto. Conheço várias pessoas que tomaram essa decisão, e, mais drásticas ainda, que decidiram apagar seus perfis da rede, por razões das mais diversas possíveis. Entendo todas. Quero falar sobre, isso sim, os efeitos dessa opção. No começo, dá muita vontade de entrar, de ver as respostas no mural, de ver as fotos das saídas da semana passada, a foto do novo bebê da amiga, enfim, todo tipo de novidade. No meu caso, uma agravante foi que, durante o meu aniversário, eu já não entrava, e, portanto, até hoje, não sei o que me desejaram. Sei que foram coisas lindas, mas só de ouvir dizer. Não sei muito bem o que acontece na minha turma, porque, praticamente, todas as comunicações são via facebook. Abro meu email várias vezes por dia, na esperança de receber notícias dos amigos com quem eu só falava pela rede, alguns dos quais me fazem muita falta. Mas ganhei muito. Afora os meus amigos de longe, com quem, realmente, é difícil falar de outro jeito, percebi como são frágeis certas amizades de nosso tempo, e como o facebook contribui para isso. Achar que mandar uma mensagem para alguém pela rede, uma vez por ano, ou comentar suas fotos, pode manter uma amizade, é ilusão que eu não tenho mais. Ausentar-se do facebook é como deixar de ir a um lugar onde todas as pessoas vão: apenas quem gosta mesmo de você continua sentido sua falta, continua fazendo parte de sua vida. E o contrário também: apenas quem você ama mesmo é quem te dá saudades. Isso é aprendizagem, é peneira que a vida oferece. Além disso, descobri que eu tenho tempo. E aí vai uma dica: se você é das pessoas que vivem dizendo que não tem tempo para nada, tente pensar no tanto de coisa que você poderia fazer enquanto está vendo a vida alheia ou a sua própria. Você também tem tempo. Eu ouvi, um dia desses, de um conhecido - que, diga-se de passagem, fica quase 24h conectado - que quase não tinha tempo para ficar com sua família, para conversar com seus pais. Ao pensar no tempo que perdemos em relacionamentos virtuais, enquanto deixamos as pessoas de carne e osso ao nosso redor tão abandonadas, não consegui evitar a seguinte pergunta: por que você consegue ficar uma hora direto no facebook, e não consegue parar meia hora por dia para conversar com seus amados, para ler a Bíblia, para falar com Deus? Há algo de muito grave acontecendo na nossa geração tecnológica, que, enquanto nos cria a sensação de que precisamos correr, porque estamos sempre atrasados, rouba nosso tempo, tão descaradamente; e nós, bobos que somos, o entregamos de mãos beijadas. Talvez eu volte a usar o facebook, mas será muito menos importante, simplesmente porque não é importante.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

De quando uma alma bonita parou meus pensamentos

Ela não me visitava há tempos. Há anos, talvez. Mesmo assim, era daquelas pessoas reais, cuja ausência parece não significar nada, porque, embora longe, eu sempre sentia sua presença, quando passava em sinais laranjas - o que ela sempre condenou em mim -, quando comia coxinhas ali na lanchonete da esquina, quando usava canetinhas coloridas, and so on. Ao contrário da maioria das pessoas, ela queria mesmo ser feliz, e, para ela, uma pessoa não poderia sê-lo se não fosse muito sincera consigo mesma e com os outros. Ela não era perfeita. Não mesmo. Tinha uns olhos grandes demais, e falava tanto que chegava a incomodar os menos acostumados. Eu falava de menos. Depois de muitos anos tentando se adaptar às pessoas e circunstâncias daqui, ela teve a coragem que quase ninguém tem de fugir com ele. Eu a admirei pela fuga e condenei-a desde o princípio pela companhia. Ele era um completo desajustado, não conseguiria lhe dar apoio, sequer a amava. Aliás, todos nós suspeitávamos de que ele só fosse capaz de amar a si próprio, porque era o que a experiência demonstrava, e eu não acreditava na mudança. Fui cética em relação a ele, e não me enganei. Mas, (in)felizmente, só o tempo é capaz de distinguir os caracteres das pessoas. Ela acreditou nele: em seu amor, em sua mudança, em seu coração. Quando ele a deixou, ela sentiu que, para continuar voando, teria que voltar à casa, para recolher-se, sofrer, chorar e trocar as penas. E eu pude conversar com a minha queridinha mais uma vez. Eis o que me disse: "Ele mudou, mudou mesmo... Todo mundo me dizia isso, elogiando o meu amor por ele. E eu fico pensando, minha amiga: será que o amei? A resposta teima em vir negativa. A verdade é que eu nunca, nunca, nunca o amei. Admirei-me de seus pensamentos livres, de seu ar de independência, de seus sentimentos complicados, de sua alma bonita. Não me olhe com essa cara. A alma dele é linda, flui. Mas hoje eu sei que ele não será feliz, nem em mil anos, porque precisa de tantas máscaras, minha amiga, para sobreviver. Não mudará, não será feliz, e carregará consigo a infelicidade, que se revelará cedo ou tarde, para todos com quem ele conviver. É que por trás de todos os disfarces, de todos os risos, de todo o sentimento intenso, o rostinho da linda alma dele chora sem parar. E chorará sempre. Ao redor dele, todos sorriem, mas lá tudo é máscara. Não são como nós, que temos orgulho das rugas do rosto e do coração." Ela teve, de novo, coragem. Mostrou ao nosso mundinho de nada que é possível tentar de novo. Ficou conosco mais uns tempos. Dias, talvez. Depois, voou mais uma vez. Agora, sozinha, mas com a certeza de que não havia outra opção: seria feliz. E é. Ele não conseguiu engatar novo voo e, contrariando mais uma vez minha querida, lhes digo, sinceramente, que de onde eu vejo, a alma dele é tão franzina quanto a sua força de ser.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Memento mori

Minha mãe, um dia desses, me contou a seguinte história, que leu em um desses emails encaminhados. Havia uma guerra entre dois povos, e os dois reis se odiavam tanto que investiram todos os seus recursos para vencer a guerra. Naturalmente, apenas um foi o vencedor. Porém, quando olhou à sua volta, só viu destruição, e não havia sobrado nenhum de seus súditos. Não suportando a solidão, saiu pelos antigos povoados, procurando algum sobrevivente, alguma frase que lhe consolasse. Andou por muitos lugares, conversou com sábios, mas nunca conseguiu a resposta que queria, até que avistou uma casa que parecia o paraíso, em meio àquele lugar tão triste. A casinha era extremamente pobre. Seu dono, muito velho, um pouco encurvado pelas surras do tempo, mas trazia, em seu rosto, um sorriso sereno. O rei vencedor, é claro, não entendeu o porquê daquela alegria, então, resolveu passar o dia na companhia do homem, que acabou lhe revelando que era um dos comerciantes mais ricos do povoado que perdeu a guerra e que, por isso, não tinha mais dinheiro algum. Ao fim da tarde, o rei não se segurou e perguntou: por que você é tão feliz, se não tem nada? O homem nada respondeu, apenas sorriu, como se admirasse a ingenuidade da pergunta. Quando entraram para o jantar, o rei, de repente, encontrou, talhada na madeira da casinha, a lição que tanto procurava. O quadrinho de madeira, já caindo aos pedaços, dizia: tudo passa.

É lição que nos ensina a viver os altos e baixos da vida, acreditando que tudo vai melhorar, quando a dor bate no coração, e aprendendo a tratar bem a todas as pessoas, porque estaremos em seu lugar, algum dia. Lembro também de um curto ditado: o homem deveria carregar uma frase em cada mão, e olhá-las quando se sentisse muito exaltado ou muito humilhado, dizendo, respectivamente "não passo de pó e cinza" e "por minha causa, o mundo foi criado."

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Um tablet por aluno...

... É a proposta da moda, nestas eleições municipais. É óbvio que além dos vereadores que prometem construir duzentas creches (note: o vereador vai construir) e dos que prometem o básico neoliberal ("prometo lutar pela saúde, educação e segurança pública"), alguém tinha que inovar. E pensaram logo: um tablet. Pois, senhores candidatos a prefeito, eu não dou meu voto a quem promete tablet para alunos de escola pública. Primeiramente, porque não entendo de que maneira jurídica isso aconteceria, porque de uma coisa eu sei, é que o Estado não pode sair por aí dando eletrônicos às pessoas sem mais nem quê. Além disso, não consigo enxergar qual a relação que esses políticos fazem entre possuir um tablet e ser bem sucedido nos estudos. De minha geração mesmo, não conheço ninguém que tenha aprendido matérias escolares em tablets, e há até os que, como eu, são completos ignorantes (ou analfainfo) no assunto. Eu sei que falta é muito nesta minha cidade para as crianças e jovens que frequentam escolas públicas: falta merenda aceitável, faltam professores qualificados, faltam cadeiras confortáveis. Em algumas escolas, acreditem se conseguirem, falta até lousa branca (usam ainda quadro negro). Falta também tratamento digno aos professores, em matéria daquilo que parece ser tão secundário aos políticos: salário. E eu fico imaginando, um professor-herói desses - que são todos os professores de nossa rede municipal, os quais, apesar de ganharem bem acima do piso estabelecido pelo MEC, ainda ganham muito pouco para o trabalho que desenvolvem (isso não é privilégio deles, mas mal de quase todo professor, nesse Brasil nosso) - no fim do mês, contando seus dois mil e poucos reais, percebendo que mal dá pra pagar as contas, enquanto seus alunos desfilam com tablets pelos corredores da escola. Não que haja problema em proporcionar condições melhores de ensino. É bom que haja computadores nas escolas, com quem saiba ensinar os estudantes a utilizá-los. Mas distribuir tablets? Por favor, senhores candidatos, tenham um pouco de bom senso. O tablet se sentiria completamente deslocado do ambiente escolar municipal. E, além disso, os senhores, que pertencem à classe média - inclusive os que se autointitulam comunistas - sabem muito bem que nem todo mundo possui um tablet em casa. Pensem nas consequências para as crianças, pensem no que farão quando, de repente, esses tablets doados forem desaparecendo, um a um, vendidos pelos pais das crianças, furtados, etc. O que vocês farão diante disso, senhores candidatos? Abrirão um processo contra a criança que desviou o recurso público? Ou deixarão por isso mesmo? Para além desses questionamentos óbvios, que, certamente, passam pela cabeça de todo cidadão escaldado por vossas promessas, resta-nos, conhecendo o passado de alguns de Vossas Excelências, nobres políticos, tão bem, a certeza de que enquanto falam em tablets e veem um sorriso no rosto de um cidadão mais desavisado, já estão sorrindo também, calculando quanto levarão na licitação desses benditos tablets (que não deve ser pouco, porque, de repente, a ideia se tornou muito recorrente). Pois bem, senhores candidatos, eu lhes sugiro, humildemente, como nova eleitora que sou, caminhando para o meu segundo voto, que abortem essa proposta, antes que todos comecem a pensar nisso. E, quanto à educação, voltem ao básico: invistam nos professores, nas instalações, nas bibliotecas, na merenda, construam novas escolas, premiem os alunos, enfim, acreditem no poder que tem a educação para mudar este país e para formar cidadãos mais responsáveis e conscientes que a maioria dos senhores.