quarta-feira, 24 de março de 2010

Quatorze Bateaux sur la vie

Era dia catorze. Sempre, tudo sempre fora no dia catorze. Ele preferia quatorze, ela catorze - nunca deu o braço a torcer. Os franceses escrevem quatorze, ela catorze e não muda. Nunca quis mudar. Inventou-se de novo muitas vezes, fez novas coisas, mas ainda é a mesma daqueles dias catorze. Um ano antes, ajoelhou-se e orou. Pediu-o. Um ano depois, teve a resposta: separavam-se definitivamente. Não foi trágico nem melodramático. Foi seco. Seco como tudo sempre houvera sido. Seco como os dias catorze.
Ela olha suas agendas passadas, os rabiscos escassos que fez em diários e ri da própria vida. O desespero que teve porque não aprendia física de jeito nenhum, a angústia por provas bobas, o estresse para conseguir as tão suadas medalhas. Não se lembra mais de física, nem das provas e as medalhas se perderam em alguma caixa das tantas mudanças que sofreu. O que não encontra, e se espanta muito, é frustração dos seus esforços. O Criador lhe deu aquilo por que lutou. E isso lhe amedronta catorze vezes mais - os primeiros tombos são os mais doloridos.
A vida dele é cíclica, a dela retilínea. Ele volveu aos seus quatorze, não ela. Por seguir, ela encontrou a abundância de sete vidas; ele, a rouquidão do deserto.
Eu os assisti, ora de perto, ora a quilômetros de distância, e sabia que tomariam rumos diferentes. Aliás, quando lhes olhava, via aquela cena de Pocahontas (os desenhos ainda são a minha associação mais próxima) em que o rio se bifurcava. Ele e ela escolheram o mesmo caminho, mas em barcos separados. Só um dos dois tinha espaço para o Capitão. Só um dos dois encontrou paz. Desde essa história, soube eu que a vida é muitas vezes sobre os barcos que tomamos e quem levamos conosco, menos que sobre o rio mais caudaloso. Ainda assim, tenho muitas opiniões - mais de catorze, certamente.