segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Passarei, passaremos, passarinhos

Imagine este cenário. Uma rua movimentada, com muitos carros, motocicletas e ônibus, que querem se mover, mas estão parados no tráfego. Dentro de um dos carros, uma mulher carrega seu filho que sangra muito, porque se machucou no colégio, e precisa levá-lo ao hospital, mas não consegue. No carro à sua frente, vem um jovem médico, apressadíssimo para chegar ao plantão, pois está cinco minutos atrasado. Pela rua, as pessoas andam, no ritmo moderno de quem olha para o relógio a cada dois segundos, porque está sempre perdendo tempo. Estudantes carregam seus livros, trabalhadores suas bicicletas, homens de negócios - os poucos que andam nas ruas - levam suas pastas de couro que querem traduzir uma idéia de importância, todos com uma urgência insana. Uns parecem felizes, outros tristes, outros nada. E eu, observando tudo aquilo, vi uma flor, como a de Carlos no meio do asfalto. Uma pequena, em roupas de balé cor-de-rosa, rodopiava segurando a mão da mãe, e ria da vida. Procurei nela, em vão, o que se desprendeu de mim - de nós - durante a vida. Mas cada existência é só. Não solitária, porque temos tantos companheiros, mas seule, unique, one-off, só.
Que a sua linda existência não escorra pelos seus dedos sem a beleza que vem do Céu e que nos permite ser como Deus quis: à sua imagem e semelhança.
Que você entenda e sinta os momentos de parar, porque, sem pausas, a correria da vida perde o sentido, e as ruas se tornam vazias.
Imagine esse cenário, essa vida, esse existir. É o que você quer?

"Não julgues que alguém viveu muito por causa de suas rugas e cabelos brancos: ele não viveu muito, apenas existiu por muito tempo."
(Sêneca, no cap. VII de Sobre a Brevidade da Vida)