quarta-feira, 8 de junho de 2011

A glance of love

Ela sempre concordou com as loucuras dele, embora lhe parecessem realmente sem sentido. Não que o amasse, porque seu coração, já tão machucado da vida, parece que não sabia mais amar. Ela gostava mesmo era da adrenalina das idéias inesperadas que ele tinha. Imaginem que um dia ele ligou para ela e lhe disse: "meu bem, te pego no trabalho hoje e vamos conhecer um lugar novo." Ela, pensando que iriam a um restaurante, arrumou-se, sem saber que terminaria a noite vendo o Sol nascer de dentro de um avião, rumo a não sei onde. E como se divertiram naquela viagem, talvez pelo simples fato de ser inesperada. Via-se claramente que entre eles não havia melancolia, nem drama, nem tristeza: só felicidade, aos montes. Por isso, ela nunca podia deixá-lo. Passaram-se anos, vieram os filhos, sem que o sorriso deixasse a alma dos meus amigos. Do rosto, fugia-lhes vez por outra, por causa dos problemas que traz a vida, mas eles sempre souberam que, sem ter um ao outro, a vida seria menos bonita. Eu os via de fora e achava-os tão perfeitos, até que um dia soube da doença dele, que foi tão cruel, levando-o em menos de duas semanas. No velório - ocasião simbólica para refletir sobre a vida e sobre a qualidade dos amigos que pensamos ter - ela não chorava. Quando conversamos, disse-me que já sabia há muito da doença do marido e que ele sobrevivera muito mais que as expectativas médicas. Disse-me, ainda, que não sabia como chorar por ele, porque a vida inteira, ele só lhe trouxera riso. Mas aprendeu. Conta-se que, depois daquele dia, ela chorou, inclusive durante o sono e as refeições, por seis meses seguidos. No primeiro dia do sétimo mês, acordou às cinco da manhã e, enquanto via despontarem os primeiros raios daquele Sol que era o mesmo dos dias felizes, algo dentro de seu espírito se acalmou. Parecia que também dentro dela o Sol retornava, cicatrizando as dores evaporadas, gota a gota, pelo tempo, e ela foi capaz, pela primeira vez, de vislumbrar o amor.